segunda-feira, 22 de abril de 2013

Cristianismo Hoje: "Não respondi sobre Malafaia"

Nunca me rendi a qualquer espécie de patrulhamento. Concordo quando compreendo que possa concordar. Divirjo quando entendo que deva divergir. É o meu modo de lidar com a vida. Faço tal alusão a propósito da reportagem publicada pela revista Cristianismo Hoje acerca do pastor Silas Malafaia. Já expressei aqui minhas divergências em relação a muitos de seus posicionamentos, bem como já fui solidário em outros que expressam as mesmas convicções que defendo. Só que lá pelo final da matéria aparece em duas ou três linhas uma frase pinçada de minhas respostas ao repórter que pouco diz sobre o que me foi perguntado. Devo, portanto, alguns esclarecimentos.

Fui procurado inicialmente pelo Danilo Fernandes, do Genizah, para uma entrevista acerca do referido pastor através do skype. Logo de início houve uma pane no sistema e, após algumas tentativas, não mais voltamos a falar no assunto. Semanas depois o editor da revista, Carlos Fernandes, a quem conheço desde a época da revista Vinde, enviou-me email no qual me perguntava se eu poderia responder algumas perguntas sobre "representatividade evangélica no país", sem citar algum nome em particular. Disse-lhe que sim e respondi todas as questões que me foram apresentadas, sem que, em nenhum momento, o foco fosse a pessoa do pastor Silas Malafaia.

Portanto, com o propósito de restabelecer a verdade dos fatos em relação a mim, transcrevo abaixo cópia de todos os emails trocados com o editor da revista para ficar claro que as minhas respostas não foram dadas tendo como objeto a pessoa do citado pastor, mas como eu via a posição evangélica, como grupo, em relação a temas que requerem algum tipo de posicionamento. A ordem dos emails deve ser lida debaixo para cima. As minhas respostas estão em vermelho. Realço também em negrito a única parte que, fora de contexto, foi aproveitada na matéria.

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Caro Carlos:

Aí vão as respostas em vermelho:
 
Geremias do Couto
 

 
 


De: Carlos
Para: Geremias dos Santos Couto
Enviadas: Sexta-feira, 15 de Fevereiro de 2013 7:46
Assunto: Re: Fw: Reportagem revista Cristianismo Hoje

Vamos lá, pastor. O material não será usado em forma de pingue-pongue (será editado); então, sinta-se à vontade para responder livremente, ok? 
 
1) Recentemente, a notícia da renúncia do papa Bento XVI pegou o mundo religioso de surpresa. Especula-se que, muito além dos motivos de saúde alegados, o que motivou a decisão do chefe católico foram intrigas de cúpula e escândalos. Em uma estrutura altamente hierarquizada como a dos sistemas religiosos, decisões como esta costumam acarretar verdadeiros terremotos - guardadas as proporções, semelhantes às que acontecem nas igrejas e denominações evangélicas quando há problemas com a liderança, como desvios morais, escândalos de natureza administrativa-financeira etc. Em sua opinião, por que os sistemas religiosos são tão centralizados e quais os principais problemas que esse tipo de concentração de poder acarretam?

A centralização, regra geral, não é um processo que ocorre da noite para o dia. Leva tempo, como demonstra a milenar Igreja Católica. À luz do Novo Testamento, esse nunca foi o plano de Deus para a Igreja. O livro de Atos e as epístolas dão ênfase às igrejas locais, embora os apóstolos tenham sido, por assim dizer, a liga de fraternidade entre elas. Todavia, na medida em que um sistema cresce, seja ele religioso ou não, produz muitas demandas, cujas respostas costumam ser a centralização pelo temor da perda do controle. Ora, isso também se traduz em poder, o caminho "perfeito" para todos esses desatinos conhecidos no meio evangélico em virtude da ambição daqueles que têm as rédeas e não querem soltá-las de jeito nenhum. Mesmo em menor escala, isso pode ser visto nas dissidências em muitas igrejas locais, às quais, em sua grande maioria, decorre do desejo de "estar à frente", ser o "manda-chuva", sentar na "cadeira do meio" e por aí vai. Centralização não combina evangelho.
 
2) Nas denominações evangélicas, particularmente nas pentecostais e, sobretudo, nas neopentecostais - já que, nas históricas, de modo geral, ocorrem sistemas eletivos -, essa questão do poder da liderança costuma ser legitimada com base em trechos bíblicos de aplicação hermenêutica duvidosa, como o de que não se deve "tocar no ungido do Senhor", com base no livro de I Samuel 24 - quando, no caso, as palavras de Davi referiam-se especificamente ao caso de Saul. Quais são, de fato, as recomendações bíblicas acerca desse assunto?

Essa é uma interpretação equivocada porque, no Novo Testamento, todos somos ungidos. Todos compomos o sacerdócio. Todos temos acesso ao Lugar Santíssimo. O véu foi rasgado. Assim, não há essa hierarquização que privilegia alguns poucos em detrimento dos demais cristãos. Identifico os dons listados em Efésios 4.11 como dons funcionais. Eles não são títulos, mas foram estabelecidos para dar funcionalidade à Igreja. É óbvio que não se preconiza, aqui, o desrespeito à autoridade, outro mal desta era. Mas assim como o corpo sente e reclama, se o coração não funciona bem, não há nenhum erro em que, como cristãos, tenhamos diálogo com os nossos líderes e, com respeito e amor, mostremos-lhes como, onde e porque estão falhando.   
 
3) Em quais situações, e sob que premissas, o crente pode e deve confrontar seu líder?

Há uma gama de situações, entre elas a má administração dos recursos da igreja, a falta de transparência na prestação de contas, o autoritarismo das decisões, escândalos morais, distorções doutrinárias e a própria indisposição para o diálogo. Creio que o padrão bíblico implica em que isso seja feito, primeiramente, em conversa pessoal, aberta e respeitosa, com testemunhas. Em segundo lugar, a Assembleia Geral costuma ser o ambiente legítimo, quando a etapa anterior não funciona. Por fim, se não há mais como permanecer na igreja, a melhor saída não é dividir, mas procurar outra, onde haja maior transparência, sempre tendo em mente que não há igreja perfeita. O importante é encontrar uma igreja saudável. 
 
4) Ao contrário da já falada Igreja Católica, o segmento evangélico, composto por centenas de denominações e milhares de organizações religiosas, não possui uma liderança que fale por ele. Por causa disso, volta e meia surgem líderes que são tidos pela sociedade em geral e pela mídia como espécies de porta-vozes dos evangélicos (Nilson Fanini nos anos 1970, Caio Fábio nos 80/90, Silas Malafaia mais recentemente). Desta forma, suas atitudes e falas acabam assumindo contornos de "posição oficial" do grupo evangélico sobre determinado assunto. De acordo com sua experiência pastoral e como dirigente de organizações religiosas, esse tipo de representatividade, ainda que não oficial, representa que tipo de riscos? A Igreja Evangélica brasileira ganharia mais se tivesse um representante que falasse por ela? A fragmentação do segmento, onde há igrejas e líderes que defendem as posições mais diversas, é boa ou ruim?

Vamos por partes;

1) Seria importante que houvesse uma organização evangélica que pudesse falar em nome dos evangélicos em questões institucionais. Tivemos a AEvB, no passado - e uma outra, anterior, cujo nome não me recordo - que chegou a exercer esse papel com bastante relevância, agregando a maioria das denominações brasileiras. 

2) Hoje, há diferente entidades, como o CIMEP, o CNPB, a OMEB, mas não têm nenhuma relevância institucional por falta de atuação e por representarem segmentos, não a igreja evangélica de maneira geral. Outro problema é que essas instituições, como a AEvB, por exemplo, cresceram de forma personalizada, numa simbiose entre o líder e a própria organização. A AEvB era o Caio Fábio. O Caio Fábio era a AEvB. Ora, quando este desaparece do cenário, por qualquer motivo, ela se despersonaliza, mas, ao mesmo tempo, não consegue avançar, pois a sua subsistência estava na personalidade de seu líder. 

3) O que temos hoje? Apenas líderes de expressão midiática que expõem os seus pontos de vista, os quais são tomados pela sociedade, regra geral, como se representassem o consenso da igreja evangélica, quando, na verdade, falam em nome pessoal, ou, no máximo, em nome do grupo que representa. Ainda acho que precisamos ter uma identidade sem ranço ideológico, com líderes de expressão, mas sem personalismos, que possa representar os evangélicos em questões institucionais.

4) Quanto à fragmentação denominacional, há dois lados: o positivo e o negativo. Comecemos pelo último. Ela enseja, por exemplo, a perda de identidade quanto aos fundamentos da fé, o surgimento de lideranças personalistas,  o aumento considerável de cristãos descompromissados que trocam de igreja como mudam de roupa e o "culto" a pessoas e não a Cristo. Mas há, também, pontos positivos, entre eles a descentralização, a diversidade de liturgia, a complementaridade de ações, em que uma igreja supre algo que a outra não tem, tornando todos indesculpáveis, se alegarem que não serviram a Cristo por não encontrar uma igreja adequada ao seu modo de cultuar. Esse discurso, hoje, não funciona.

Bem, aí está. Espero tê-lo ajudado com o pouco que tenho.

Abraços,

Pastor Geremias
 
Basicamente, é isso, pastor. Fico agradecido, mais uma vez, por sua ajuda.
 
Deus o abençoe
 
Carlos

Sent: Thursday, February 14, 2013 7:46 PM
To: Carlos
Subject: Re: Fw: Reportagem revista Cristianismo Hoje

Manda ver, meu caro!
 
Pastor Geremias do Couto
 

 


De: Carlos <carlosfernandes5@uol.com.br>
Para: Geremias dos Santos Couto <gerecouto@yahoo.com.br>
Enviadas: Quinta-feira, 14 de Fevereiro de 2013 19:27
Assunto: Re: Fw: Reportagem revista Cristianismo Hoje

Pastor
 
Tudo beleza?
 
Estou precisando de mais umas opiniões suas... Desta vez, para uma matéria sobre a representatividade evangélica no país. A Igreja Católica tem (quer dizer, daqui a pouco não tem mais) um chefe único que fala por ela. E os evangélicos? Como fica a questão, sobretudo diante de temas delicados que requereriam a posição evangélica como grupo?
 
Posso lhe mandar duas ou três perguntinhas RÁPIDAS sobre o assunto?
 
Abção

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É isso.

6 comentários:

ROBSON SILVA disse...

"O material não será usado em forma de pingue-pongue (será editado); então, sinta-se à vontade para responder livremente, ok?"...

QUE A GENTE SE SENTE LIVRE PARA PUBLICAR APENAS O QUE NOS INTERESSAR, COM ENFASE ÀQUILO QUE PRETENDEMOS PASSAR... AINDA QUE NÃO SEJA A TUA VERDADEIRA SIC)OPINIÃO!

Esses caras só podem estar de brincadeira!

Abraço!

daladier.blogspot.com disse...

É meu caro, o mar não está pra peixe. A audiência (polêmica) é o que interessa. Que Deus nos guarde. O mais engraçado é que esse pessoal quer ser vanguarda. Repetindo os mesmos erros...

Pr. Anderson Luciano Betim Ribeiro disse...

Está tudo muito claro, ainda que não necessitaria nem publicar os emails. Sua palavra tem sido sempre temperada, coerente e justa. Uma pena que faltou clareza de quem se julga tão idôneo. Falta de respeito!

Memórias das Assembleias de Deus disse...

Pastor Geremias:

Não me surpreende esse tipo de coisa, pois quando se abandona a ética e se procura torcer palavras para fundamentar uma tese. Péssimo jornalismo!

Abraço!

Anônimo disse...

Que coisa...

Comprova-se que o interesse talvez seja só polemizar, publicar o que é do interesse da revista ou qualquer material, e não a opinião do entrevistado em si, já que o entrevistado que é procurado.

Difícil viu...

Parabéns pastor! Não se deve deixar nosso nome jogados por aí. Deus abençoe pela postura sensata de sempre.

o menor de todos os menores. disse...

Caro pr. Geremias do Couto,

A paz amado!

Aí está a fórmula do sucesso de muitos prevaricadores que se aproveitam do bem para implantar o mal.

O mal está na mente destes que somente utilizam recursos andróginos para satisfazerem o EGO dos muitos seguidores que se alimentam da falta de responsabilidade e da fraqueza dos que pensam serem crentes.

Esquecem: crente até o diabo é.

Estão em cima do muro e tentam brincar com os que pertencem aos dois lados do muro.

Esquecem estes, por infantilidade, que por brincarem com cobras, a principal especialidade. Ficam desatentos a verdade e esquecem da experiência e da autoridade espiritual, de muitos poucos, que não se deitam com baal e não admitem conviver com mamom.

Esquecem estes que, as suas trilhas, são de mentiras, provocações, e não passam de trapos de imundícias e de võmitos, aos seguidores que adoram a palavra zombar. De quem, não importa. Importante é que agradem aos deuses criados por humanos em suas trouxas de roupas sujas.

Triste saber que permitem o crédito aos sujos e imundos em sua escondida prevaricação com o marketing diabólico e povoado de mal cheiro ou fedor.

O Senhor seja contigo,

O menor.